Cratera da Lua seria um oásis, com mais água que o Deserto do Saara
Publicada em 22/10/2010 às 11h12m
O Globo
RIO - A Lua guarda tesouros que até recentemente os cientistas ignoravam. Quando, em outubro do ano passado, a Nasa, a agência espacial americana, arremessou contra a cratera Cabeus um pedaço de foguete e o satélite Lcross, parte do Lunar Reconnaissance Orbiter, eles esperavam detectar na nuvem de poeira levantada apenas alguns traços de água. O que encontraram, no entanto, vai muito além disso: prata e outros minerais que podem se mostrar fundamentais para a manutenção de uma eventual estação lunar, além de uma espécie de oásis com mais água que o Deserto do Saara. As conclusões foram publicadas em uma série de artigos na revista "Science" desta semana.
- É um recurso valioso e confirma que algumas partes da Lua têm mais água que a Terra - disse Anthony Colaprete, principal investigador do Satélite de Sensoriamento e Observação de Crateras Lunares (Lcross, na sigla em inglês), da Nasa.
Haveria 4 bilhões de litros de água
As areias do Saara têm de 2% a 5% de água. Na Lua, a quantidade do líquido cristalizado na cratera, que fica em uma escuridão permanente, chega a 8,5% da mistura e é bem mais fácil de ser extraída do que a do deserto. Os cientistas estimam que a Cabeus guarde algo em torno de 4 bilhões de litros de água. Purificada, ela poderia ser usada pelos astronautas para beber ou até mesmo transformada em hidrogênio e oxigênio, essenciais para o combustível de naves espaciais.
- É um número alto, bem maior do que estávamos antecipando - afirmou Colaprete. - A cratera é um oásis no deserto lunar. Os recursos estão lá e potencialmente podem ser usados em missões futuras - acrescentou.
A colisão do pedaço de foguete e do Lcross com a Lua foi transmitida pela internet e causou frustração na época, já que o impacto não gerou explosões, fogo ou fumaça. Mas, ao analisar os resíduos do choque, os cientistas encontraram muito mais do que estavam procurando. Em novembro do ano passado, uma equipe anunciou que o impacto tinha levantado ao menos 100 litros de água, confirmando a suspeita de que havia água nas crateras da Lua. Com os novos dados, as estimativas subiram para 152 litros. Ao calcular a quantidade de resíduos soltos pelo choque, foi possível estimar a quantidade do líquido dentro da cratera pela primeira vez.
Também causou surpresa aos pesquisadores os outros elementos e moléculas detectados pelo Lcross próximo ao pólo sul da Lua. As substâncias foram encontradas num dos lugares mais frios do Sistema Solar, com temperatura de 187 graus Celsius negativos no lugar mais profundo da Cabeus, marcada por uma história de impactos e acúmulos de detritos por mais de 2 bilhões de anos.
- É como se ela fosse um reservatório do nosso clima cósmico - explicou Peter H. Schultz, professor de Ciências Geológicas da Brown University. - Este lugar parece uma arca do tesouro dos elementos, de compostos que foram liberados por toda a Lua e que foram reunidos neste balde nas sombras permanentes.
Além da prata, os cientistas detectaram a presença de cálcio, magnésio e mercúrio na Lua. Diante desta variedade de minerais, eles agora podem examinar sua abundância relativa e especular que tipos de objetos atingiram o satélite ao longo de sua história. Parte do material parece com o que é encontrado em cometas, enquanto outra pode ter sido produzida por reações químicas, o que indicaria que a Lua tem um ambiente dinâmico.
Segundo a Nasa, ao entenderem os processos e ambientes que determinariam onde a água pode ser encontrada na Lua, como ela chegou lá e o ciclo do líquido no satélite, planejadores de futuras missões poderão escolher melhor os locais de pouso.
- Creio que os pólos (da Lua) acabam de abrir muitas novas questões para nós - disse Schultz. - Acho que é nosso destino voltar lá, e não apenas em termos comerciais - concluiu.